Thursday, March 1, 2012

ENTREVISTA - CARLOS SEVERINO

Muito já foi dito acerca do nosso próximo entrevistado, fez uma carreira brilhante no jornalismo e abraçou um grande projeto, ainda com Roquete, permanecendo no Sporting de 1998 até 2006 como responsável máximo pela comunicação do clube. Atualmente, colabora com o Correio da Manhã e dá uma "ajuda" no jornalismo regional da sua amada terra, Loures. Um comunicador como poucos, foi um enorme prazer para nós conversar com Carlos Severino, um verdadeiro Gentleman.

Carlos Severino em 1993, na Austrália, ao serviço da TSF

Cabelo Do Aimar:Pablo Aimar continua a encantar toda a nação benfiquista, com o seu futebol de classe e com o seu “ganda” cabelo. O que acha dele? E do seu cabelo?

Carlos Severino:Pablo Aimar foi recuperado para o futebol pelo Benfica. É um excelente executante e explora bem o seu visual que o distingue dos demais.

CdA:Segundo o blog “Polvo dos Papalvos”, após a final de Viena, alguns investigadores tentaram perceber se houve doping na equipa portista. Que relação tem com esse blog?

CS: Nada tenho a ver com o blog Polvo dos Papalvos, do qual só agora tive conhecimento da sua existência. Quanto a um alegado caso de doping na final de Viena, nunca tinha ouvido tal. Na minha opinião tratou-se de uma brilhante vitória do F. C. Porto, que no campo foi superior ao Bayern.

CdA: Valentim Loureiro foi sempre apontado como o grande mestre da corrupção. Isso levou a que os clubes de Lisboa se aliassem a Pinto da Costa, especialmente Damásio. Essa aliança teve algum efeito benéfico para os clubes lisboetas? Era Damásio, amigo do “sistema”?

CS: Valentim sempre foi um estratega astuto. Aos clubes de Lisboa dizia mal de Pinto da Costa, mas na verdade tinha uma boa relação com o ‘papa’ com quem repartia os ‘negócios’ futeboleiros. Damásio deixou-se envolver. Ganhou o campeonato de 94, o tal dos 3-6 em Alvalade depois do Sporting perder nas Antas e acabar com 8 jogadores em campo. O então presidente do Benfica acabou por ir para presidente da Liga substituindo Pinto da Costa. Pouco tempo depois disse-me que nada mais queria com Pinto da Costa. Foi o fim de Damásio no Benfica.

CdA: O Presidente do Boavista foi dos primeiros a fechar a porta ao Movimento dos Presidentes, ao que se seguiu Luís Filipe Vieira. O que realmente os levou a abandonar esse movimento, sendo que nessa altura eram “amigos” de Pinto da Costa?

CS:O Movimento dos Presidentes é o concretizar de um desejo de Dias da Cunha que só surgiu depois de Pinto da Costa aceitar o repto do presidente do Sporting. E porquê Pinto da Costa? Dias da Cunha entendia que o presidente portista já tinha ganho tudo e por isso estaria disposto a participar na regeneração do futebol português, apagando a imagem das situações menos claras com que era conotado. E tudo correu bem até que Benfica e Boavista se retiraram, alegadamente pelo Estrela da Amadora pedir a descida de divisão do Benfica por atraso nos vencimentos aos jogadores! E assim terminou uma ação que chegou a juntar todos os clubes das Ligas profissionais.

CdA:Quem tramou o Boavista?

CS:Os Loureiros tiveram mais olhos que barriga. Quem se tramou foi mesmo o Boavista.

CdA: O Carlos trabalhava no Sporting com Roquete, quando este abandonou o clube por incompatibilidades com Luís Duque. Quais eram essas incompatibilidades, e em que medida estavam relacionadas com o ainda desconhecido “sistema”?

CS:Roquete não era um homem do futebol. Convidou Duque, por sugestão de… Valentim Loureiro! Com a conquista do campeonato, Luís Duque pode ter pensado que teria condições para assumir a presidência do Sporting. Afrontou Roquete e este, por sua vez, entendeu que não estava para se sujeitar e saiu. Duque montou o seu ‘sistema’ para levar o Sporting ao título. Rodeou-se por gente que trabalhou bem nos bastidores, como foram os casos de José Veiga e do ex-árbitro Pinto Correia. Mas depois teve de pagar a fatura. O famoso ‘custo’ zero de João Pinto, cifrado em 10 milhões de euros, foi o ‘emblema’ de um movimento anormal de custos que deixaram os cofres de Alvalade nas lonas.

CdA: Fala em José Veiga. Ele foi apontado como o grande responsável pelo título benfiquista de 2005. Mais tarde acabaria por abandonar o clube, acusado de muitas artimanhas que levaram a buscas às suas residências. Veiga pertencia ao sistema? Luís Filipe Vieira não sabia disso?

CS: José Veiga é um produto do ‘sistema’. Aprendeu e depois afrontou-o. Com isso, não só foi fundamental no título do Benfica, como nos dois títulos do Sporting e no campeonato conquistado pelo Boavista. Veiga não sai do Benfica por ser do ‘sistema’. Saiu porque o ‘sistema’ se encarregou de o afastar. Estava a ser nefasto para os ‘donos’ do negócio futebol. Vieira não quis perceber.

CdA: Referiu que Dias da Cunha foi afastado por membros do próprio clube. Fala até de uma série de personalidades que se juntaram num célebre almoço, no Estoril, para celebrarem a derrota do próprio clube. Quem eram?

CS: Desse almoço não resultou o afastamento programado de Dias da Cunha. O Sporting venceu no Estoril por 4-0 e os ‘conspiradores’, faziam passar que a presença de Dias da Cunha na Amoreira seria pouco recomendada, mas tiveram de meter a viola no saco. Quanto a nomes, só posso adiantar que era gente de dentro do Sporting, com ligações à direção e ao futebol. Havia também um conhecido empresário com muitos negócios em Alvalade. O jogo realizou-se em Outubro de 2004.

CdA:Fala-se insistentemente de elementos destabilizadores no clube, mas ninguém se chega à frente com nomes...

CS: O Sporting tem um grave problema estrutural. Desde João Rocha que não há um presidente que domine os meandros do futebol. Quando assim é, acaba sempre por haver desencontros criados por falta de uma voz de comando e isso reflete-se nos resultados desportivos e financeiros. A estrutura do Sporting é constituída por um conjunto de ‘quintinhas’ onde pululam interesses pessoais muito difíceis de controlar.

CdA:Como viu a reentrada de Carlos Freitas no Sporting?

CS: Carlos Freitas é um funcionário que conhece bem os bastidores, claros e escuros, do mundo do futebol. Declarou-se amigo de Moggi e de D´Onofrio contratando, com o aval dos dirigentes, é claro, mais de uma centena de jogadores para o Sporting. No seu registo de negócios não constam vendas dignas de aplauso pelo benefício que trouxeram aos leões. Foi com ele que se venderam Ronaldo, Nani e Quaresma, mas esses eram produto da formação. Freitas trabalhou com os dirigentes Duque, Ribeiro Teles e José Bettencourt que deveriam explicar a razão das opções pelos jogadores contratados cujos custos criaram o grande desequilíbrio nas contas do clube.

CdA: Foi o Carlos que sugeriu a contratação dos serviços de Marinho Neves pelo Sporting. Durante os anos em que lá trabalhou, forneceu informações blindadas do sistema. Como sabia ele com antecedência o nome dos árbitros? Existem “bufos” no sistema?

CS: Marinho Neves, para além de ser um homem muito bem informado, é um bom amigo. Por isso não tive dúvidas em sugerir o seu nome para nos ajudar no Sporting. Não é para qualquer um, mas o chamado ´sistema’ é algo que tem tantos buracos que se torna fácil nele penetrar. No convívio com as diversas personagens, facilmente nos apercebemos como tudo funciona, porque eles não escondem. Como jornalista assisti à maneira brejeira, para não chamar outra coisa, como os conotados com o ‘sistema’ falavam dos dirigentes de Sporting e Benfica. “ Tudo bons rapazes”!

CdA:Será que nos pode contar algum caso caricato que tenha ocorrido durante essa altura?

CS: No Sporting, mediante informações que Marinho Neves fornecia, foram feitas algumas ações para prevenir situações que podiam prejudicar o clube. Recordo-me que nas vésperas de um Benfica – Sporting soubemos que o árbitro nomeado para o jogo era um fervoroso benfiquista, sócio de 20 votos e de camarote. Pedro Proença, nem mais. Estrategicamente passámos isso a um jornal desportivo e a outro generalista, que conseguiram comprovar a veracidade dos factos. Contas feitas, o Sporting venceu por 3-1, com Proença a assinalar um penálti a favor dos leões, logo aos 5 minutos, que gerou muita polémica.

CdA:Na sua opinião, o título de 2005 foi roubado ao Sporting. Terá sido o Benfica, com manobras de bastidores, ou o próprio “sistema” montado no norte do país, que queria a todo custo acabar com o incómodo Dias da Cunha?

CS: Sem dúvida que Dias da Cunha incomodava. Depois de dizer, em entrevista à RTP, os nomes líderes do ‘sistema’, e em privado, junto do próprio, que Joaquim Oliveira era o 3º rosto do dito, Dias da Cunha foi alvo, na minha opinião, de linchamento público, quer através dos OCS do dono da OliveDesportos, quer através de outros dirigentes do Sporting que intervieram em público contra Dias da Cunha por este se aliar a Vieira no combate ao ‘sistema’. Está nessa posição Miguel Ribeiro Teles, o dirigente que nas eras Roquete, Dias da Cunha e Soares Franco mais tempo esteve à frente do futebol leonino. Tudo isto ajudou a uma desestabilização interna que acabou por se refletir nos resultados daquela que podia ter sido a melhor época, de sempre, do Sporting, mas que acabou conhecida pela temporada do “Quase”.

CdA: Marinho Neves disse recentemente que sabe o porquê das arbitragens duvidosas nos jogos dos leões desta época, mas recusa-se a revelar o motivo. Você sabe?

CS: O Marinho Neves é uma pessoa muito bem informada, mas desconheço a que se refere. Só sei que o Sporting não tem influência na promoção ou despromoção dos árbitros, por isso era, e é, o elo mais fraco.

CdA: Se pudesse deixar uma mensagem aos leitores da blogosfera, que cada vez mais preferem a informação que recolhem em blogs aos próprios jornais desportivos, qual seria?

CS: O mundo do futebol envolve muitos interesses que vão muito para além dos relvados. A realidade é que há quem defenda o seu emblema, com métodos que merecem menos ou mais simpatia, e obtenha resultados, como é o caso no F.C. Porto. Outros nem por isso. No Benfica a situação tende a mudar. No Sporting vai ser muito difícil a mudança do estado atual. Godinho Lopes quer, mas dificilmente vai conseguir mudar o rumo. O facto de ter outros a mandarem no futebol pode-lhe ser fatal. Perante este cenário, os adeptos que não se iludam. Quando vão para os estádios pesem sempre que tudo pode estar muito para além do espetáculo no relvado. Assim terão menos deceções.

Carlos Severino
CPJ: 1496 

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